quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Tempo é senão medida arbitrária

   Soluciono minha angústia, resolvido a escrever poemas. Na idade de rápido queimar a chama, uma euforia crescente se aproxima e me envolve, na prontidão de meu estro, busco em exaustiva ânsia versos a por nos cadernos como se busca o alimento da vida a por nas mesas. Desembainho a caneta apto a tratar da natureza, que em orvalhos sonolentos da manhã nos oferta sua primeira lágrima, apto a cuidar com as mais doces palavras as dores dos casais gentis que se amam, ou apto em meu ímpeto discursar interminavelmente o meu sentir quanto a beleza infinda da donzela amada, e para todos me sinto afeito. Mas sei bem, como o sabe quem ama, que a efusão traz consigo a tormenta do depois, que é a culpa do não se conter agora.
   Acalmo primeiro meu corpo, para então sossegar a alma. Apenas quando mansos, os sentimentos pontiagulham duas ou três palavras no papel. Não que me faltem os andamentos, as formas ou as regras para preencher as linhas, os sentidos é que me são poucos, na mente quase nada há de mutável, pois a semântica me coage ao silêncio, à confissão do não pendor para escrita poética. O palpável deve ser socorrido, o salário, a guerra, o sexo, e deve ser mais bem elucidado, pois o é possível; já o desejo de tocar os corações deve continuar pairando invisível e ninguém deve tornar trazê-lo ao chão. Vivo agora a idade da conformação. Isso, ou o impulso da inspiração vai esfriando, mas a vontade do poema não morre.
   Descubro finalmente o porquê das paixões e dos trabalhos. Vencida a vida e no seu próprio fim, resulta inútil o preocupar-se com aparências por não o mais poder, também o dar vazão completa ao que se sente. Não sei a razão de só agora ter percebido o quão pouco foi-me sempre o tempo. Da fugaz beleza moça às primeiras zangas do ofício, preservei um só costume, o qual foi meu refúgio em tempos escuros e a própria liberdade enquanto descansava: a poesia. Atualmente, para as fugas repentinas da memória receito-me a leitura completa dos meus cadernos, transpassando a vida de um personagem que tanto se assemelha a mim quanto à identidade que busquei .