sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Modelo de amor não deu certo

Para amar Mariana bastou-me estar distraído
Fiz um desenho com a mão errada
Disse que ia pra longe, voltaria logo
Passou o tempo esqueci
Para amar Carolina procurei a beleza
Fiz um desenho com a mão errada
Disse que ja tinha outro
A beleza sumiu depois


Para amar Juliana o dia nasceu amarelo
Fiz um desenho com a mão errada
Disse que gosta do que eu também
Fui forçado ao descaso

Para amar Beatriz foi tiro no escuro
Fiz um desenho com a mão errada
Disse que trabalhava sem hora
Bati o ponto a tempo

Para amar Cristina toquei um fado
Fiz um desenho com a mão errada
Disse que cantava a morte
Vestiu de preto o corpo todo

Para amar Colombina colei o desenho
Escrito Pierrot á procura debaixo
Disse ao outro que pode chorar
Arlequim doído pegou o lenço

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Certo dia o ouvi

- Olha flor, antes de tirar-te o chão quero dizer uma verdade ou outra. Saibas que daqui do jardim tua beleza não é a que mais desperta o interesse dos outros; tens o cheiro um tanto enjoativo, daqueles que basta sentir uma vez pra querê-lo cada vez mais longe; tuas pétalas estão manchadas em preto; e além de teu vermelho estar sujo feito terra, tu só tens um espinho bem pequeno. Como pode, uma flor só ter um espinho? [...] Quero também dizer, oh tua flor, que na tua idade deverias estar radiante como a luz que atravessa as nuvens; deverias ser a mais procurada da região, e quando encontrada: Deverias esgueirar-te e seduzir a quem quer que fosse; deverias, tua pequena murcha, nesta mesma idade, ser disputada por todos os insetos e proliferar-te pelos campos mais diversos, fazendo um mundo de seus descendentes. Porém, ficas aí. Como esperas que alguém te queira assim? [...] E mais um posto: Venho me perguntando o motivo de estares tão sozinha nesse canto do jardim. Pareces uma planta repulsiva, a qual nenhuma outra se atreve nascer por perto. Serás tão egoísta a ponto de não dividires os minerais? Transmites uma solidão que nem sei explicar: Todos do outro lado estão comemorando, polinizando, respirando; e tu estás aqui debaixo desta árvore que nem se importa contigo. Achas mesmo que no mundo haja um que te queira? [...] Pois bem rosa, vou dizer-te de uma vez o que quero. Sabes bem e mais que ninguém, que ao dar-te, estarás morta; ao puxar-te do chão será seu fim e não mais voltarás a florecer, serás já sem vida neste instante. E por não ser meu intuito dizer que meu amor começará morto como a rosa dada, que será inevitável, assim como tu secares e murchares, que ele se esvaia depois de um tempo, peço então para ti, oh flor: Faça-te imponente, enfrente-me a tal altura e não te rendas enquanto ainda tiveres vida. Atinja-me, pequena planta, com seu espinho único; e faça do meu gesto uma vitória épica para que me tenham, um dia, gosto.


   E sem esperar pela resposta cortou-lhe o caule de uma só vez. Tocou a campainha e então eu pude ver o rosto da voz. Ele a entregou-me, mas eu não o quis. Fechei a porta, e sentada junto a ela, ninei a rosa em meus braços.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Fases

A história de desencontros

Começa quando ele a quer, porém não toma providência alguma. Só faz pensar, na menina de flores, por todo o dia e por toda noite; e à tardinha inclusive. Nunca amou ninguém e não sabe por onde começar. Assim, relendo poemas de amores mal iniciados e de declarações frustradas, encontra motivos pra querê-la mais; imagina o amor que a daria.
Derrete-se de paixão.

Ela, tão sentimental quanto ele: amou muito por tempos atrás e se conseguira finalmente ser feliz, viu que deu muito trabalho. O conhece então com essa premissa de que não mais se entregaria. Passa os dias então o esperando para dar-lhe o que ele quer de uma vez. E pra não ter titubeios nem outros intermédios com joguinhos de criança, usa-o.
Entrega-lhe um beijo.

A transição     

Se dá quando ele é surpreendido, apesar de ter sonhado com isso, pelo beijo da menina branca. Já sabendo que é amor, se torna inteiro trovador; poeta, florista e compositor. Mas pelas reações dela não entende o que faz errado; porque não é igualmente retribuído? Percebe-se que anda exagerado e promete conter-se. Apesar da tortura que e amá-la, não diminui nada no carinho dado.  

Derrete-se na dúvida.

Satisfeita pelo beijo conseguido, tenta fugir da história outrora vivida. De início o ignora e pede pra que não exagere na tentativa de iludi-la, apesar de saber no fundo que ele é sincero. Teme se doar e não receber carinho de volta. Apesar da resistência percebe a paixão que chegou para ela. Define as regras e diz como ele deve agir a partir dali. Em seguida aceita, com o pé atrás, o amor que a inquieta.

Entrega-lhe o coração
Tempos de fim

É porque negou de todas as maneiras, no início, mas cedeu aos pedidos e conformes dela. Longe da caneta e do violão, abre mão de si. Diz que a ama quando pede e se não pede fica quieto. Não perdeu o amor, mas não tem vontade de dizer; não passa noites em claro pensando nela; e reaprendeu a dizer não. Parece estar mais ausente que nunca. Fica dias sem chamar e quando chega, logo vai.

Derrete-se quando convém.

Finalmente, como queria, ele é perfeito. Foi difícil, mas agora acabaram as gracinhas dele. Sentia de dentro um calor indescritível que a apavorava, mas não recebe mais flores nem é musa de poemas, o calor se esvai. Aquieta-se enfim, pensando no que faz para perder o homem que ama. Por não o aceitar como o faz parecer, agora chora por ele não ser o cara inventivo, que nunca se ia. 

Entrega-lhe o que mais ninguém tem.


domingo, 3 de outubro de 2010

O beu cabelo


é que quando você aparece
vem-me dizer nada e já enlouquece
faz-te pequena e desengonçada
tem a cabeleira inteira embolada

é que fecha os olhos toda chorosa
vem-me bater a mão de unha pintada
faz-te arrependida da fúria cantada
tem a cabeleira que se anuncia prosa

é que beija usando a mão delicada
vem-me e arrepia sempre do mesmo jeito
faz-te em pedacinhos que eu vou catar

a cabeleira é pra ser cheirada
a cabeleira é pra ser avistada
a cabeleira da minha amada

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Me, explico vivo

e se de tanto naufragar, enjoei
depois de tanto procurar, não achei
  sua cara linda a pintar, me neguei
ir sem você navegar!

e se de tanto querer, me perdi
dentro do seu calor, o que eu vivi
me serviu de lição pra contar, por ai
onde você ancorou!

e se hoje não te tenho, mais
vale a pena lembrar, de você
quero um mergulho no mar, pra te ver
quando poema secar!