domingo, 28 de agosto de 2011

A porta, o arquipélago

Trava. Destrava a tranca, tranca logo depois. Trava a tranca,
o trinco fica aberto mesmo. O trinco não fecha, pois senão não abre.
Fecha a trinca que alguém entra quando fica aberta, o trinco não! 
O trinco ninguém abre, por isso ninguém fecha, mas fecha a trinca que alguém entra.
Fechado feito fecho. Eu não fecho porque estou dentro mas você fecha quando for,
trinca e fecho estão travados pois ainda estamos trancafiados aqui.
O trinco destravava quando se fechava. O trinco agora travou, 
e ninguém tranca quando sai, apenas fecha. Mas quando tranca, 
fecha o trinco e aí ninguém,
ninguém abre a porta.

Hoje sei que não sou ilha. Toda atitude altruísta é válida, é única, só existe
Eu seria mais de mim sem outros tantos? Não
posso responder a mil perguntas, mas todas são respostas a alguém.
O outro, inimigo ou pedra ou gente, vive por mim também
então nunca mais o nego. Sou por você, meu outro ser.
Faço sempre por você, mato por você, e machuco os outros
por eles e por você. Não sou: só reflito pele, músculos, pelos.
Meus pés, e os seus, os deles, estão molhados, pois nos movemos juntos.
Tenho terra para plantar, muita comida é para você: Outro.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Um dos três

1.

o tempo é como vinho
leva tempo até poder desfrutar
já a poesia é como água
nasce assim de todo lugar
mas alguém ainda faz o milagre
de poesia fazer tempo virar

2.  

outro dia caiu um homem do meu lado
na calçada e de cabeça
tinha pulado do prédio para desestressar
que pessoal indelicado
inventam sempre uma modinha
e ninguém nem para me contar

fui pesquisar e descobri que até faz bem à saúde
se chama suicídio ocupacional
e já usam na medicina

por isso agora
para fugir do tédio
uso sempre aquele prédio alí na esquina

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Urbanismo

Estou correndo velozmente até que me param
Uma mão acena do outro lado
A rua me nega passagem, mas sigo
Viro a esquina e já não há vaga
E quero comer, pedir depressa
Estaciono e faço parte do mar de gente
Que não é gentil, eles também comeram depressa
Dentro de prédios não se sabe para quem trabalhamos
As horas são passadas a força
Denovo pela rua, não existe horizonte na cidade
Compro remédios para o estômago
Pessoas nunca gostam de ler livros grossos
Dou moeda ao malabarista, uma grande
A moto do menino cai pela canaleta
Acelero em todas as vinte e quatro horas do dia
Calculo o tempo de viagem até lhe encontrar:
- Não, você não acenou para mim. Eu teria visto.